Take 3 – Amor Desesperado
Sara,
As tuas palavras tiveram o condão de me paralisar completamente. Aperto o peito para conter o coração que ameaça sair pela boca! Lidar com a rejeição nunca é fácil, mas sabia ao que me expunha quando te escrevi. No entanto, aquilo que me magoou foi mesmo a verdade nua e crua, não foi a rejeição. Dizes que não me quiseste magoar e eu acredito que o não fizeste intencionalmente, mas durante meses aceitaste os meus avanços, sem uma palavra, sem um aviso que me impedisse de caminhar para o precipício. Não tiveste pudor em deixar o teu ego ser engrandecido, sabendo que no fim quem seria magoado era eu. Isso deixa-me triste. Esperava algo diferente de ti.
Acontece que a realidade nem sempre é mutável e poucas vezes se compraz em satisfazer os nossos desejos. Apesar disso, não me arrependo de te ter aberto o meu coração. Não fazia sentido esconder por mais tempo este sentimento que como dizia Camões: é fogo que arde sem ser ver… Acontece, também, que já estive no teu lugar e compreendo a tua posição. Não será isso que vai colocar em causa a nossa amizade. Essa amizade que tanto vale para ti…
Também eu quero ser teu amigo, mas existem sentimentos que não se misturam. O amor e a amizade são como o azeite e a água. Só conseguirei sentir amizade por ti no dia em que deixar de te amar e, nesse dia, só Deus sabe aquilo de que serei capaz de sentir! Portanto, aquilo que me pedes é impossível. O ser humano é capaz de suportar as maiores dificuldades, sacrifícios ou dores, desde que dentro dele viva a esperança. Tu mataste essa esperança. Estar a teu lado, sabendo que estou condenado a receber amizade para o resto da vida é completamente insuportável. A solução que me resta é afastar-me e deixar-te seguir o teu caminho. Ser teu amigo é pior que o suplicio de Tântalo. Não sei que juízo fazes de mim ao pedir-me isso, mas eu não sou assim tão forte. A verdade é que neste momento me sinto a pessoa mais frágil do mundo.
Desde que li a tua carta que deixei de sonhar. O jardim da minha fantasia deixou de ter flores e tornou-se um lugar triste e desolador, onde apenas existem galhos secos, que me espetam, a cada movimento que faça, lembrando-me tudo aquilo que perdi. O banco está cheio de cardos e as rosas, que sobre ele pendiam, murcharam deixando apenas silvas com espinhos. O meu coração está árido, seco e solitário. Apesar disso, nada tenho contra ti e na minha mente até consigo racionalizar a possibilidade de uma amizade, mas o meu coração insurge-se, grita, chora e esperneia, como uma criança birrenta, exigindo a minha atenção. Tenho de cuidar dele, pois só temos um e o seu falecimento é a nossa morte e, apesar da dor e da tristeza, esse é um sentimento que não habita em mim.
Desculpa se desta vez não consigo satisfazer um pedido teu, mas crê que não é humanamente possível fazê-lo. Quem sabe se, com o passar do tempo, isso ainda pode vir a acontecer. Mas o tempo, que tudo cura, também é inexorável em relação à sobrevivência, quer do amor quer da amizade: longe da vista, longe do coração!
Na hora da despedida o meu coração ainda quer agarrar-se a uma réstia de esperança e pergunta-se: «Se te sentes tão bem no banco do jardim, porque não te deleitas nele, para a eternidade?» Tu és a alma desse jardim e, se quiseres, podes ser também a sua rainha!
Despeço-me com o ósculo do amor. Não direi que é eterno, mas sim que me irá assombrar durante muito tempo.
Manuel