Lisboa, 03/12/2020 (Portugal)
Olá Jaqueline,
Espero que esta carta te encontre mais tranquila. Isto de trabalhar muito, inclusive ao fim de semana, suga-nos as energias e não apenas a física. Por aqui tudo sem novidades, tirando a pandemia que continua à solta. Estou numa fase em que consigo dar uma resposta em pouco tempo, mas acredito que não será sempre assim. Vamos caminhando, e alimentando esta amizade transatlântica e lidaremos com o espaçamento da correspondência quando ele aparecer.
Recostado no cadeirão que me acolhe, num abraço carinhoso, suportando as minhas impaciências, durante mais ou menos catorze horas por dia, comtemplo o exterior e reflito sobre os últimos tempos. Sobre os tempos que vivemos. As ruas estão quase desertas, apesar do sol desafiar os poucos passantes a manter o casaco, que diligentemente vestiram pela manhã, para se protegerem do frio, abotoado. Vencerá, mas rapidamente se dará por vencido, pois, assim que os edifícios, na sua majestade, se interpuserem, o frio regressará e golas subirão para aconchegar os pescoços, obrigando as pessoas a apressarem-se em direção a casa.
Foi bom saber de ti e saber mais de ti. Espero que tenha corrido tudo bem com as eleições, embora considere que, infelizmente, acabamos, pelo menos na maior parte das vezes, por eleger alguém que cuida bem dos seus interesses, ao mesmo tempo que ignora os de quem o elegeu. Talvez seja apenas a minha desilusão a falar! Apesar disso e mesmo não sendo o voto obrigatório, em Portugal, voto em todas as eleições.
O outono e a primavera são, efetivamente, estações do ano equilibradas, onde o tempo é mais complacente com o ser humano. Dito isto, eu também gosto do frio (ninguém me tira uma semana de esqui, todos os anos. Bom, não sei como será em 2021, com a pandemia…) e adoro apanhar sol numa praia, desde que não seja na hora de maior calor. Isso nunca gostei. Percebo que, com a idade, a tolerância para com esse tipo de estremos, o calor e o frio, seja menor. Eu próprio tenho essa experiência, mas já vi passarem por mim cinquenta e nove primaveras, tu pareces-me mais jovem, mas não somo todos iguais…
Fui dar uma espreitadela (como se diz por cá) nos teus blogues e gostei daquilo que vi. Encontrei mais uma coincidência. Eu também gosto de escrever para maiores de dezoito. Na verdade, os meus livros e os meus contos têm todos algum erotismo, no entanto, não são para maiores de dezoito. No meu blog tenho uma secção erótica, mas apenas publiquei um conto, depois decidi guardar os outros para mim. Neste momento uma das minhas afilhadas, a mais dotada em arte, está a produzir uma capa para um e-book e estou a pensar reunir as doze histórias que escrevi, até porque são sequenciais, numa única publicação. Desisti das editoras e vou fazer a publicação direta na Amazon ou noutra editora qualquer, onde a publicação seja gratuita. Se tens vontade de publicar explora também essa possibilidade.
É verdade, partilhamos a docência. Também é verdade que sentimos que o ano letivo que terminou, para nós em setembro e para vocês em janeiro do ano que vem, foi definitivamente um ano diferente. Um ano em que o afastamento físico, o famoso afastamento social, foi a tónica, com as implicações que isso tem. Ainda ontem estive duas horas e trinta, em frente ao computador, a assistir à entrega dos diplomas de todos os mestrados e pós-graduações, da universidade onde leciono. Foi uma cerimónia muito bonita, apenas com a presença física da coordenadora administrativa de cursos, dos alunos premiados e do professor que fez a entrega dos prémios. A alegria de ver mais um ano letivo concluído não apaga a tristeza provocada pela ausência dos abraços e apertos de mão de outros anos. Pelas histórias e peripécias dom ano letivo, narradas ao vivo e em primeira mão. Enfim… O são convívio entre pessoas que aprenderam a respeitar-se e quiçá se tornaram amigas.
A esperança de que possamos regressar rapidamente a uma vida normal alimenta-nos e ainda bem porque os tempos são difíceis e essa esperança é fundamental. No entanto, espero que, ultrapassada a pandemia, o mundo tenha aprendido que vivia com excessos que são perfeitamente dispensáveis e que estavam a contribuir para uma degradação acelerada do planeta, que nos recebeu de braços abertos e nos deu tudo, mas que podemos estar em vias de matar. Espero que possamos ter aprendido a viver sem esses excessos! É como dizes, temos de ser resilientes!
Termino por aqui, deixando um abraço carinhoso de aquém-mar, para além-mar, despedindo-me até à volta do correio.
Manuel