O besouro da rádio, colado no teu ouvido.
Um despertar lasso, sem o galo madrugador.
Um arrazoar lento, que carece de sentido.
Um travo amargo, que te acomete o sabor.
A noite que deixou os fantasmas à solta.
Autênticos no sonho, como na realidade.
O sonho que se foi, mas que está de volta.
A filáucia ferida, pela falta de dignidade.
Acordas indignado, com o teu outro eu,
Que nos sonhos teima em ser poltrão.
Fazendo do tergiversar algo muito seu,
Vela pelo interesse, mofando do coração.
Vestes a pele daquele que queres ser,
Orgulhoso de tal e pleno de convicção.
O Eu dos sonhos teima em aparecer,
Com afinco, privas o mundo da revelação.
Temes revelar ao mundo aquilo que és,
Rafando a vida sem realmente a viver.
Queres viver com o mundo a teus pés,
Ignorante de que apenas estás a sobreviver.
Acordaste do sono, mas continuas a sonhar,
Com uma vida de sonho, que vives dormindo.
Deixas que ela passe, sem querer desasnar,
Pensas que vives, mas apenas estás fingindo.
Porque preferes essa ilusão, em vez da realidade?
Viver uma vida vazia, sem luta, nem emoção!
Sem guerras com o mundo, foges da verdade,
Vives em guerra contigo, matando o teu coração.
Que acordar é esse que te deixa modorrento?
A vida passa por ti, sem a conseguires viver!
Acordado, vives num sonho, cozido em fogo lento,
Não sendo quem és, mas quem querias ser.